O exército americano usava a sigla VUCA ou VICA (em português) para descrever a volatilidade (volatility), a incerteza (uncertainty), a complexidade (complexity) e a ambiguidade (ambiguity) nas diversas situações e contextos de guerra. O uso militar dessa sigla começou no final dos anos 90 no meio Corporativo para tratar das ferramentas e métodos necessários para fazer frente a um ambiente extremamente agressivo e desafiador. Após os atentados terroristas desde 2001, os contextos VUCA passaram a ser o novo “normal” no ambiente militar americano.
Recentemente alguns profissionais incluíram as siglas M.U., onde: M (Meaningful) - Significado/Propósito e U (Universal) - Universal, ficando o acrônimo "MUVUCA".
O uso no mundo dos negócios é mais recente, começou a ser usado a partir de 2010, mas não difere do pensamento militar, afinal, o ambiente empresarial na atualidade também é agressivo, desafiador, competitivo e veloz, ou seja, esse também é o novo “normal” das organizações de qualquer natureza.
O mundo VUCA não poder ser dissociado da gestão baseada em riscos. Estar aberto às novas possibilidades em um ambiente de incertezas certamente passa pelo desejo e coragem de transitar em novos caminhos antes nunca utilizados. Sintetizando diversos conceitos e suas definições, podemos explicar o MUVUCA dessa forma:
Meaningful - Significado/Propósito
Tudo o que fazemos precisa ter sentido, propósito, significado. Mas a empresa tem missão, valores, por que precisaria de um propósito? Porque o propósito não é nem a visão, nem a missão e nem os valores, como explica a Harvard Business Review.
Um propósito real, verdadeiro e palpável dá um motivo tangível para que decisões sejam tomadas e, tarefas, executadas. Enquanto a missão descreve o negócio, a visão indica onde a empresa estará em alguns anos e os valores descrevem a cultura, o propósito inspira e dá orientação prática. O propósito é um motivo para se orgulhar, para acreditar que o seu trabalho tem impacto em algum lugar. Ele é um norte e deve ser claro e compartilhado por todos, como um compromisso moral.
Universal – Universal
O que se faz aqui pode repercutir muito além. Sempre precisamos analisar o impacto de nossas decisões. A tomada de decisão é o que move o ser humano. Mas para onde você está indo? Em uma empresa, o líder é o responsável por fazer escolhas que refletem diretamente no negócio. Muitas vezes, esse processo não é fácil. Assim, a tomada de decisão pode ser uma dor de cabeça.
Na sua vida pessoal, ocorre o mesmo. Cada escolha é, de fato, uma renúncia. Você escolhe um caminho e abandona o outro. Então, como tornar esse processo mais tranquilo? Como planejar, estruturar e organizar sua decisão para que essa tomada de ação seja mais assertiva e direcionada para os seus objetivos?
O gestor geralmente é quem se responsabiliza por esse processo, que pode envolver diferentes graus de dificuldade. Afinal, nem sempre é fácil fazer escolhas que, sem dúvidas, trarão impacto ao negócio.
No entanto, a tomada de decisão é absolutamente importante para uma organização. Sem ela, a empresa pode perder negociações e descartar oportunidades de crescimento no mercado, por exemplo. As escolhas ocorrem a todo momento: quando é preciso investir em produtos, negociar com fornecedores e reformular uma equipe, entre outros. Como toda a decisão tem um impacto no universo ou num todo; o gestor, empreendedor, líder e demais profissionais, devem tomar suas decisões com um visão holística (num todo). Qualquer decisão pode impactar nos lucros e resultados, nos colaboradores, na natureza, na sociedade em geral etc.
Em uma decisão, dois aspectos principais entram em jogo: a razão e a emoção. Encontrar um balanço entre os dois, muitas vezes, é difícil. Mas esse equilíbrio é fundamental para que o gestor não acabe fazendo escolhas erradas e mal planejadas.
Volatility - Volatilidade
Tudo muda rapidamente, precisamos reagir rápido. Trata-se da velocidade em que ocorrem as mudanças e seus impactos. Atualmente nada é permanente e as tecnologias, preferências, tendências e certezas são inconstantes e altamente mutáveis. Quer dizer que o mundo é muito fluido, muito líquido, ou seja, muda muito rapidamente. Aquilo que ontem era de um jeito, amanhã já é de outro. E essa volatilidade faz com que o mundo empresarial seja bastante desafiador. Essa característica indica a magnitude das mudanças, que podem ser maiores e mais surpreendentes.
Uncertainty - Incerteza
A única certeza que temos é que não temos certeza de nada. Se relaciona com as dúvidas, indecisões e imprecisões típicas de um contexto em que os conhecimentos são normalmente incompletos. Por isso é cada vez mais difícil levantar cenários futuros com base em acontecimentos passados. Nós temos dificuldade de enxergar para onde vamos e qual o próximo passo. Nós não sabemos, ao certo, o que vai acontecer amanhã. Há alguns anos atrás, seria um pouco mais fácil fazer previsões, ou seja, olhar para frente e identificar como seria a empresa no futuro. Hoje é muito difícil fazer previsões justamente por causa dessa incerteza. O futuro está difícil de ser previsto.
Complexity - Complexo
As soluções dos problemas são mais complexas, as realidades são difíceis de interpretar. É a dificuldade de compreender o resultado das interações das inúmeras variáveis de uma determinada situação, desafio ou problema. É comum encontrarmos contextos que possuem múltiplos aspectos ou elementos cujas relações de interdependência são incompreensíveis ou confusas. As respostas para o mundo são muito difíceis assim como as relações são diferentes. Não podemos dizer que existe apenas uma resposta correta, mas sim diversas possibilidades de respostas para as situações. Essa característica mostra que existem diversos fatores internos e externos que podem afetar o negócio e que, muitas vezes, estão fora do controle do gestor.
Ambiguity - Ambiguidade
O que é bom hoje pode não ser amanhã. A maioria das situações em que vivemos aceita diversas possibilidades de caminhos diferentes justamente porque podem assumir diferentes sentidos. São várias possíveis respostas a uma única questão, mas, nem todas costumam apresentar as melhores soluções. Essa característica nos mostra que, muitas vezes, é muito difícil entender a natureza do problema. Pelo fato de existir tantas incertezas e falta de clareza no mundo empresarial, torna- se cada vez mais difícil encontrar uma coerência nos acontecimentos em busca da melhor solução, o que pode gerar más interpretações e falsas respostas. Não é mais “isso OU aquilo” e sim é “isso E aquilo”.
Soluções ao mundo VUCA
O escritor e palestrante Bob Johansen do Instituto para o Futuro desenvolveu um modelo de liderança eficaz como um possível contrapeso para o VUCA e batizou como VUCA PRIME que é um tipo de “VUCA Positivo”.
Para ele, são necessários 4 atributos que também se iniciam com as letras VUCA (em inglês) ou VECA (em português): Visão (Vision), Entendimento (Undestanding), Clareza (Clarity) e Agilidade (Agility). O VUCA PRIME de Johansen exige que os líderes se concentrem na construção de Visão, Compreensão, Clareza e Agilidade como caminho para lidar e superar os impactos do mundo VUCA.
O autor diz que a volatilidade pode ser combatida com a visão, pois os líderes fornecem e reforçam o caminho a seguir e navegam na turbulência para alcançar o sucesso. Para a volatilidade do mundo, precisamos ter visão: significa que precisamos ajudar as pessoas enxergarem onde se pretende chegar, ou seja, mostrar a sua equipe o propósito que querem alcançar e o legado que querem deixar. A visão exige uma resposta explícita às três perguntas:
Por que estamos aqui?
Como seremos bem-sucedidos?
Quais são as nossas medidas de sucesso?
Contra a incerteza do mundo, precisamos ter entendimento: explique o porquê e seja coerente, pois num ambiente incerto, precisamos dotar as pessoas de certezas. Deve-se ainda transformar as incertezas em entendimento para todos os membros da equipe a fim de proporcionar uma mentalidade compartilhada e compreensão de como eles podem contribuir para o sucesso, juntamente com os principais princípios operacionais que promoverão a comunicação ativa e práticas de envolvimento generalizadas.
É essencial uma comunicação contínua e consistente em duas vias. Não é apenas falar com pessoas – deve envolver a escuta ativa para ganhar bem como dar a compreensão. E como o mundo é complexo, precisamos de clareza: mostre à sua equipe como as coisas devem acontecer, torne as coisas simples e diminua a complexidade, assim elas terão clareza do passo a passo.
A complexidade pode ser minimizada pela clareza que vem da construção de disciplinas em torno dos princípios, reforçando constantemente as prioridades reais e evitando as atividades sem valor agregado. Dedicação para ser centrado no cliente e manter-se conectado para dar e receber feedback deles pode minimizar a complexidade desnecessária. Uma grande área de oportunidade para reduzir a complexidade e aumentar a clareza relaciona-se com sua informação interna e integridade de dados.
Finalmente, contra a ambiguidade, precisamos de agilidade: isso significa que precisamos ser rápidos, nos antecipar e adaptar as mudanças e especificações de cada momento, lugar e pessoa. Para isso, diminua estruturas e burocracias e empodere as pessoas da sua equipe. Uma vantagem competitiva neste mundo VUCA é a agilidade dos líderes, equipes e unidades de negócios. A agilidade é uma capacidade organizacional avançada que permite que uma organização responda de forma mais rápida, eficaz e sustentável que seus concorrentes quando as circunstâncias de mudança assim exigirem.
Como esse ambiente interfere na gestão das empresas?
Quando a organização realiza um planejamento estratégico, suas metas precisa ter um Propósito para melhor entendimento da meta e que este propósito ou significado seja o mesmo por parte da equipe e liderança. Vale lembrar que as empresas ao realizarem suas metas, planejamentos etc, há um impacto nas pessoas (colaboradores), na sociedade em geral, na natureza, na concorrência etc - há sempre uma consequência das nossas ações no Universo ou num todo.
Quando temos uma situação onde conhecemos bastante sobre ela e temos ampla noção da previsibilidade de nossas ações, podemos dizer que estamos em um contexto Volátil, pois, apesar desses dois atributos derem positivos, sabemos que as coisas podem mudar rapidamente e as certezas e conhecimentos podem ficar obsoletos.
A Incerteza é fruto de situações com ações de resultados imprevisíveis, mesmo que tenhamos conhecimento sobre elas. Quando possuímos pouco conhecimento sobre determinados contextos e cenários podemos dizer que estamos em situação de Complexidade, mesmo que saibamos com bastante precisão os resultados de nossas ações. A Ambiguidade, por sua vez, é decorrente de situações em que temos pouca previsibilidade das ações e baixo conhecimento.
Podemos representar MUVUCA através de uma matriz que faz a correlação entre o “conhecimento que temos sobre uma determinada situação” e a “previsibilidade dos resultados possíveis de nossas ações”:
O principal efeito do Mundo VUCA nas empresas é a dificuldade para se planejar diante das constantes mudanças de cenários. Assim, as organizações podem enfrentar obstáculos em diferentes contextos. Por exemplo:
manter a relevância perante o surgimento de novos modelos de negócios ou de uma concorrência disruptiva;
lançar um novo produto ou serviço diante da incerteza da receptividade do consumidor;
expandir a atuação da empresa em ambientes complexos, como países em desfavorável situação política e econômica;
conceber um novo modelo de negócios ou se lançar em um mercado emergente, entre outras situações.
Em um contexto VUCA, as organizações:
precisam tomar decisões de forma rápida e, muitas vezes, correndo riscos;
não conseguem se manter competitivas sem estar constantemente aderindo novas tecnologias;
sofrem maiores impactos dos fatores externos por conta da globalização;
precisam criar experiências satisfatórias para clientes internos e externos para conseguir manter o interesse deles;
têm dificuldade em planejar a longo prazo, já que o cenário pode mudar em pouco tempo;
devem atualizar as políticas internas para que não perpetuem culturas e comportamentos ultrapassados e negativos;
precisam se preocupar mais com a imagem transmitida à sociedade, já que as informações correm de maneira acelerada;
têm que administrar um ambiente onde diversas gerações atuam juntas (baby boomers, X, Y, Z).
Qual é o papel do RH neste cenário?
Diante de toda a imprevisibilidade do Mundo VUCA, as companhias devem se preparar para lidar tais inevitabilidades – visto que estão na iminência de enfrentarem, eventualmente, alguma dificuldade nesse ambiente.
Leia também: O que é RH Ágil
A gestão de RH, que intermedia as relações entre instituições e profissionais, precisa se adequar a esse cenário desafiador. É fundamental, para a área, entender com profundidade quais mudanças impactam o profissional da atualidade e a empresa como um todo.
Os desafios dessa nova era motivam o desenvolvimento de competências que permitirão uma atuação profissional verdadeiramente relevante e eficiente, tais como:
agilidade;
colaboração;
multidisciplinaridade;
criatividade;
mindset digital;
resiliência;
atualização.
O Recursos Humanos (RH) deve olhar para fora e ver o que os clientes desejam, para então, buscar os novos talentos para a organização. E mais, estes talentos devem ser comprometidos, já que sabe-se que profissionais comprometidos produzem mais e, ao final, podem gerar maior valor para os clientes, investidores e comunidades. Só que para serem comprometidos, é preciso que estes encontrem significado no trabalho e nos valores da empresa.
Leia também: O que é Fit Cultural.
Assim, o RH, consciente do mercado atual e dos elementos que retêm talentos com alta contribuição, devem estar constantemente verificando como estão os conhecimentos e habilidades dos funcionários para que possam entregar o que os agentes externos esperam. O RH também deve analisar se os valores da organização possibilitam aumento de comprometimento ou engajamento nos seus empregados e, ainda, se os empregados encontram significado e propósito no seu trabalho, de forma a que se sintam motivados a fazê-lo diariamente.
O RH precisa mais do que nunca gerar e gerir a capacidade dos empregados para que possam fazer a melhor entrega aos clientes. Desta forma, deve monitar a eficiência, gerenciar mudança, colaborara interna e externamente, inovar no modelo de negócio e produtos, no acesso à informação e deve estabelecer uma cultura apropriada. A cultura é outro aspecto fundamental. Ela vai estar mais relacionada com uma identidade, ou seja, uma reputação da empresa.
O RH deve refletir até que ponto a cultura definida a partir do olhar de fora para dentro assegura as formas de se pensar e agir dentro da organização, ou mesmo, se os processos criados estão organizados para avaliar e transformar a cultura, ou ,se as ações de gestão refletem a cultura desejada.
Também é preciso que o RH trabalhe para uma liderança mais profunda e coletiva e não individual, e que façam coaching, avaliações 360º e criem planos de desenvolvimento individual para aumentar as capacidades de liderança dos líderes da organização. Um boa liderança não traz somente engajamento, traz confiança também.
Leia também: Coaching como aliado ao RH.
No que tange a liderança é essencial que o RH reflita constantemente sobre a importância da liderança coletiva dentro da empresa, sobre a marca da liderança, sobre as avaliações das capacidades de liderança para conhecer suas forças e fraquezas e sobre o desenvolvimento de líderes para que respondam às necessidade de negócio futuras.
A RHEIS Consulting atua na dimensão humana das organizações promovendo o desenvolvimento pessoal e organizacional com tecnologia. Consulte-nos.
Leia também: Do mundo VUCA ao BANI.
Sugestão de Livros:
Pense de novo: O poder de saber o que você não sabe (Adam Grant);
Líder Ágil, Liderança Vuca: Como liderar e ter sucesso em um mundo de alta volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade (Verônica Rodrigues);
A estratégia do oceano azul: Como criar novos mercados e tornar a concorrência irrelevante (W. Chan Kim, Renée Mauborgne);
Por que os generalistas vencem em um mundo de especialistas (David Epstein);
Antifrágil (Nova edição): Coisas que se beneficiam com o caos (por Nassim Nicholas Taleb);
O poder da simplicidade (Susanne Andrade);
Lean Inception: Como alinhar pessoas e construir o produto certo (Paulo Caroli);
Da estratégia ágil aos resultados: Uma combinação de abordagens adaptativas, mudanças dialógicas e gestão avançada de projetos (Heitor Coutinho);
A startup enxuta: Como usar a inovação contínua para criar negócios radicalmente bem-sucedidos (Eric Ries);
O novo poder: Como disseminar ideias, engajar pessoas e estar sempre um passo à frente em um mundo hiperconectado (Henry Timms, Jeremy Heimans);
Avalie o que importa: Como o Google, Bono Vox e a Fundação Gates sacudiram o mundo com os OKRs (John Doerr).
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