Crenças e Valores Pessoais e Organizacionais: Fundamentos Invisíveis que Sustentam a Cultura e o Desempenho das Empresas
- RHEIS Consulting
- 5 de ago.
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Muito se fala sobre estratégia, processos e tecnologia nas organizações, mas raramente se discute com a devida profundidade os alicerces invisíveis que sustentam tudo isso: as crenças e os valores. Eles não apenas moldam a cultura corporativa, mas influenciam diretamente a forma como as pessoas se relacionam, tomam decisões e constroem significado dentro das empresas.
Compreender como crenças e valores atuam — nos níveis individual, coletivo e organizacional — é essencial para promover ambientes mais éticos, engajados e coerentes com os desafios do século XXI.
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Crenças e Valores: O que são e como se diferenciam
Embora frequentemente confundidos, crenças e valores possuem naturezas distintas. As crenças são convicções pessoais, aprendidas ao longo da vida, que orientam a interpretação da realidade. Baseadas em experiências e contextos, elas influenciam atitudes e julgamentos e podem tanto impulsionar quanto limitar comportamentos. Por exemplo, alguém que acredita que “errar é sinal de fraqueza” pode evitar riscos importantes.
Já os valores são princípios duradouros, geralmente conscientes, que orientam o que uma pessoa ou organização considera importante e digno de promoção. Valores como respeito, justiça, inovação, empatia e responsabilidade social servem como guias éticos e estratégicos. Enquanto crenças respondem a “o que eu acho?”, valores respondem a “o que é importante para mim, para nós ou para a organização?”.
A Atuação em Diferentes Níveis
Crenças e valores se manifestam em múltiplas dimensões. No nível individual, eles moldam o comportamento pessoal, influenciam a forma como o colaborador percebe o ambiente de trabalho, interage com colegas e toma decisões.
No nível coletivo, refletem normas compartilhadas por grupos ou equipes, formando o que se conhece como cultura de equipe. Já no nível organizacional, os valores expressam aquilo que a empresa, como entidade social, valoriza em sua missão, visão e estratégias — e idealmente, também em suas práticas diárias.
Quando há sintonia entre os valores pessoais e os valores organizacionais, observa-se um ambiente de maior engajamento, comprometimento e alinhamento ético. Por outro lado, a dissonância entre esses níveis pode causar frustração, desmotivação e conflitos éticos, comprometendo o desempenho individual e coletivo.
Cultura Organizacional e Identidade Coletiva
A cultura organizacional é o solo fértil onde as crenças e valores se expressam. De acordo com Edgar Schein, a cultura pode ser analisada em três níveis: os artefatos (símbolos visíveis, como linguagem, vestimentas e layout), os valores defendidos (como a empresa diz que age) e os pressupostos básicos (crenças inconscientes que orientam o comportamento real). Nesse modelo, os valores atuam como intermediários entre o que é visível e o que é estrutural.
Organizações com culturas consistentes, em que os valores declarados são verdadeiramente vividos, tendem a ser mais confiáveis, coesas e atrativas para talentos. Elas constroem uma identidade organizacional forte, geram confiança interna e externa, e se tornam mais resilientes diante das transformações do mercado.
Os Tipos de Valores
Os valores podem ser classificados de diferentes formas, dependendo do autor ou da abordagem (filosófica, psicológica, organizacional, etc.). Abaixo estão os principais tipos de valores organizados em categorias amplamente reconhecidas:
Tipo de Valor | Descrição | Exemplos |
Valores Pessoais | Princípios que guiam o comportamento individual, influenciando decisões e atitudes. Formam-se ao longo da vida por meio da educação e cultura. | Honestidade, liberdade, lealdade, coragem, espiritualidade, persistência |
Valores Sociais | Regulam o comportamento em grupo e refletem normas de convivência em sociedade. Fundamentais para o convívio e os direitos humanos. | Justiça, solidariedade, igualdade, tolerância, paz, respeito às leis |
Valores Morais | Ligados à noção de certo e errado. Influenciam julgamentos éticos e comportamentos baseados em princípios. | Honestidade, responsabilidade, empatia, integridade, gratidão |
Valores Culturais | Relacionados a práticas, crenças e tradições de um povo ou comunidade. Variam entre regiões e contextos. | Tradição, identidade, língua, patrimônio, simbolismo |
Valores Organizacionais | Princípios que orientam a cultura, decisões e práticas de uma empresa. Costumam estar presentes na missão, visão e políticas internas. | Inovação, excelência, ética, comprometimento, sustentabilidade, foco no cliente |
Valores Econômicos | Relacionados à utilidade, produtividade e custo-benefício. Presentes tanto em decisões pessoais quanto empresariais. | Rentabilidade, eficiência, produtividade, poupança, crescimento |
Valores Estéticos | Associados à percepção de beleza, harmonia e expressão artística. Influenciam escolhas culturais, de design e comunicação visual. | Criatividade, elegância, sensibilidade, equilíbrio, inspiração |
O psicólogo social Shalom H. Schwartz propôs uma teoria com 10 tipos de valores universais, agrupados em quatro categorias principais:
Categoria | Tipos de Valores | Exemplos |
Abertura à mudança | Autodireção, Estímulo | Liberdade, curiosidade, aventura |
Autotranscendência | Benevolência, Universalismo | Justiça social, igualdade, cuidado com o próximo |
Conservação | Tradição, Conformidade, Segurança | Ordem, respeito, segurança pessoal |
Autopromoção | Poder, Realização | Sucesso, prestígio, influência |
Os Tipos de Crenças
Existem diferentes tipos de crenças, que podem ser classificadas com base em sua função, origem ou impacto no comportamento. Abaixo, apresento as principais categorias de crenças segundo a psicologia, a sociologia e também o campo do desenvolvimento pessoal:
Tipo de Crença | Descrição | Exemplos |
Crenças Centrais (Nucleares) | São profundas e formadas na infância; moldam a visão sobre si, os outros e o mundo. | “Não sou bom o suficiente”, “O mundo é perigoso” |
Crenças Limitantes | Restringem o potencial pessoal e dificultam mudanças ou conquistas. | “Não consigo aprender isso”, “Não mereço sucesso” |
Crenças Potencializadoras | Ampliam o potencial e favorecem o desenvolvimento pessoal e profissional. | “Sou capaz de superar desafios”, “Tudo pode ser aprendido” |
Crenças Sociais ou Culturais | São compartilhadas por grupos ou sociedades, moldando normas e comportamentos coletivos. | “Homem não chora”, “Estudar é o caminho para vencer na vida” |
Crenças Religiosas ou Espirituais | Relacionadas à fé, espiritualidade ou doutrinas religiosas. | “Tudo tem um propósito”, “Existe um ser superior guiando nossas vidas” |
Crenças Cognitivas (TCC) | Interpretações da realidade que influenciam emoções e ações, segundo a psicologia cognitiva. | “Se eu errar, serei rejeitado”, “Preciso agradar a todos para ser aceito” |
Crenças Organizacionais | Crenças coletivas dentro de empresas, formais ou informais, que orientam condutas e decisões. | “Aqui quem fala pouco é promovido”, “Só cresce quem agrada o gestor” |
Crenças Auto-referenciais | Convicções sobre si mesmo, que afetam autoestima, autoconfiança e identidade. | “Sou um fracasso”, “Sou uma pessoa criativa e determinada” |
Impactos Práticos sobre o Desempenho
Crenças e valores impactam o desempenho organizacional em níveis distintos:
1. Valores e crenças individuais: motivação e engajamento
No nível individual, os valores funcionam como guias internos de conduta. Quando há congruência entre os valores pessoais e os da organização, o colaborador tende a sentir-se mais motivado, engajado e conectado ao propósito da empresa. Essa identificação fortalece o senso de pertencimento e reduz o turnover. Por outro lado, o desalinhamento pode gerar conflitos éticos, frustração e desengajamento, afetando diretamente a produtividade e a saúde mental do profissional.
Além disso, as crenças individuais impactam a forma como os colaboradores interpretam desafios, mudanças e relações de poder. Um colaborador que acredita que “a empresa se preocupa apenas com o lucro” tenderá a se proteger emocionalmente e entregar o mínimo necessário, enquanto aquele que acredita que “a empresa valoriza o desenvolvimento das pessoas” estará mais aberto a colaborar, inovar e buscar resultados com autonomia.
2. Crenças e valores coletivos: clima organizacional e coesão
No nível coletivo, as crenças e os valores compartilhados moldam o clima das equipes. Grupos que valorizam a cooperação, a transparência e a confiança tendem a apresentar maior coesão, comunicação eficaz e resolução construtiva de conflitos. Esses fatores, por sua vez, favorecem o desempenho coletivo, a criatividade e a tomada de decisão em grupo.
Por outro lado, ambientes onde predominam crenças disfuncionais como “não se deve confiar em ninguém” ou “quem compartilha conhecimento perde poder” tendem a gerar climas tóxicos, competição destrutiva e fragmentação. A presença de valores coletivos positivos pode, portanto, mitigar as limitações de crenças individuais negativas — e vice-versa.
3. Valores organizacionais: alinhamento estratégico e desempenho institucional
No nível organizacional, valores institucionalizados impactam diretamente os processos decisórios, a forma como a organização lida com seus públicos e a maneira como ela responde às mudanças do mercado. Empresas com valores organizacionais claros, praticados e coerentes tendem a tomar decisões mais alinhadas, cultivar lideranças mais éticas e manter a consistência entre o discurso e a prática — o que aumenta a confiança interna e externa.
Valores organizacionais como bem-estar, reconhecimento, estabilidade, equidade e propósito têm forte impacto na confiança dos empregados e na redução do estresse ocupacional. Além disso, empresas que alinham seus valores com práticas de responsabilidade social e sustentabilidade constroem reputações mais sólidas, atraem talentos e fidelizam clientes.
4. Desempenho coletivo e resultados sustentáveis
A combinação entre valores individuais, coletivos e organizacionais gera efeitos sistêmicos no desempenho organizacional. Quando os três níveis estão alinhados, cria-se uma “zona de congruência” que favorece a fluidez dos processos, a inovação e a geração de valor sustentável. Por outro lado, a incongruência entre esses níveis — como quando a empresa declara valores de inclusão, mas tolera práticas discriminatórias — compromete a credibilidade institucional, gera cinismo organizacional e impacta negativamente os indicadores de desempenho.
Em resumo, o impacto dos valores e crenças sobre o desempenho se dá por meio de três mecanismos centrais:
Motivação e engajamento pessoal (nível individual);
Qualidade das relações e do clima de grupo (nível coletivo);
Coerência estratégica e confiança institucional (nível organizacional).
Investir na gestão consciente desses elementos, promovendo o alinhamento entre níveis e estimulando a vivência autêntica dos valores, é um dos caminhos mais eficazes para elevar o desempenho humano e empresarial de forma ética e sustentável.
A importância da gestão consciente dos valores
Para gerar impacto real, os valores devem ser vividos e não apenas declarados. Isso exige diagnóstico contínuo, revisão e integração em todas as práticas da empresa, desde recrutamento até avaliação de desempenho.
No livro "A Organização Dirigida por Valores" de Richard Barret, destaca que organizações que alinham suas estratégias aos valores essenciais têm maior engajamento, inovação e resiliência. Os valores são o “DNA” da cultura, e sua gestão deve acompanhar a evolução do mercado e da sociedade. A liderança é fundamental para incorporar e transmitir esses valores, garantindo que eles orientem o comportamento coletivo e não sejam apenas palavras vazias.
Considerações finais
Crenças e valores são a base invisível que sustenta tudo o que acontece dentro de uma organização. Eles influenciam as escolhas estratégicas, moldam o comportamento das pessoas e definem, em última instância, a identidade e a reputação da empresa. Ignorar esses elementos é correr o risco de construir uma organização sem alma, frágil e desconectada das pessoas que a compõem e da sociedade que a cerca.
Por outro lado, organizações que compreendem e gerem seus valores de forma consciente tendem a ser mais éticas, inovadoras, engajadas e preparadas para os desafios do presente e do futuro. Afinal, mais do que ter bons produtos ou processos, é preciso ter clareza sobre quem se é, o que se valoriza — e como esses valores são vividos no cotidiano.
A RHEIS Consulting mapeia e realiza diagnóstico dos valores, crenças e outros fatores pessoais e organizacionais. Fale com a gente.
Leia também em Employee Experience (EX): A Importância da Experiência do Colaborador para o Sucesso da Empresa.
Podcast

Sugestão de Leitura:
Crenças: caminhos para a saúde e o bem-estar (Robert B. Dilts);
A Organização Dirigida por Valores (Richard Barrett);
Cultura Organizacional e Liderança (Edgar H. Schein, Peter Schein);
Employee Experience, Gestão de Pessoas e Cultura Organizacional (Roberto Madruga).
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