O que tem a ver a Política Pública com a minha Empresa?
- Mike Reis

- 13 de out.
- 6 min de leitura
É comum que empresários enxerguem a política pública como um cenário distante e restrito a decisões partidárias. No entanto, o cotidiano empresarial é moldado por esse ambiente político, que dita regras, impõe limites e oferece oportunidades. Compreender essa relação é essencial para antecipar riscos e aproveitar oportunidades, independentemente do tamanho do negócio.
Políticas públicas são o conjunto de programas, ações e decisões do Estado — em âmbito municipal, estadual ou federal — voltados a atender demandas da sociedade em áreas como saúde, educação, segurança, infraestrutura, meio ambiente e economia.
Cenário Atual e Impactos nos Negócios
Alguns dados recentes ilustram como o ambiente político-econômico influencia diretamente as empresas:
Carga tributária recorde: em 2024, a carga tributária brasileira atingiu 32,32 % do PIB, o maior patamar desde 2010. O aumento se concentrou principalmente na tributação sobre bens e serviços, renda e lucros, especialmente fundos de investimento.
Índice de competitividade: Brasil fica em último no ranking de competitividade industrial, diz CNI. Estudo revela que ambiente econômico, educação e infraestrutura limitam desempenho do Brasil frente a 17 economias concorrentes.
Elevado custo com pessoal público: segundo cálculos baseados em dados do FMI, os salários de servidores (União, estados e municípios) representam em média 8,9 % do PIB, impactando orçamento público e, indiretamente, o ambiente empresarial.
Esses números evidenciam que a política molda custos, regras e oportunidades no ecossistema empresarial.
Política Pública como Determinante de Competitividade
É impossível falar em competitividade no Brasil sem colocar a política pública no centro da discussão. Quem ignora esse fator, corre o risco de ficar para trás. Não se trata apenas de acompanhar decretos ou mudanças de lei, mas de perceber como cada decisão governamental afeta diretamente a vida das empresas.
A carga tributária, por exemplo, não é apenas um dado técnico. É um peso que obriga empresários a rever preços, fornecedores e margens de lucro. Quando o governo sinaliza reformas, não é só contabilidade que entra em jogo: é a própria sobrevivência de muitos modelos de negócio.
Na legislação trabalhista, a flexibilização recente não foi apenas uma atualização jurídica — abriu margem para novas formas de trabalho, como remoto e temporário, que transformaram a forma de gerir equipes e de atrair talentos. Quem se antecipou ganhou vantagem.
Infraestrutura, então, fala por si. Basta comparar o custo logístico de uma empresa instalada perto de um porto moderno com outra presa em estradas precárias. O que chamam de “investimento público” é, no fim das contas, competitividade ou gargalo.
Regulamentações setoriais também não são detalhe burocrático. Do agronegócio à tecnologia, cada norma pode ser um freio ou um trampolim. Basta lembrar que no setor de saúde, sem certificação, não há mercado; e no de tecnologia, ignorar proteção de dados significa perder confiança antes mesmo de escalar.
A política ambiental hoje deixou de ser discurso para virar estratégia. Empresas que apostam em certificações verdes não apenas atendem exigências legais, mas conquistam consumidores cada vez mais atentos. Sustentabilidade virou diferencial de marca.
E não dá para ignorar a educação e a capacitação profissional. Políticas públicas nessa área definem se haverá mão de obra qualificada ou não. E para quem empreende, isso significa gastar fortunas treinando do zero ou ter acesso imediato a profissionais preparados.
Por fim, as políticas econômicas e monetárias — juros, crédito, incentivos — são como o vento para um veleiro. Podem acelerar ou paralisar qualquer expansão empresarial. Fingir que são neutras é ingenuidade.
Política como Guia para Tendências e Inovação
O fato é que política pública não é apenas “regra do jogo” - é bússola. É a partir dela que se desenham tendências de inovação e se abre espaço para oportunidades.
Quando o governo estimula práticas sustentáveis, está sinalizando para onde o consumo caminha. Quando cria programas de digitalização e incentivos a startups, está dizendo quem terá vantagem nos próximos anos. Quem ignora esse recado fica defasado.
O mesmo vale para políticas de inclusão social e diversidade. Mais do que exigência legal, são um termômetro do que a sociedade valoriza. Empresas que embarcam nessa agenda cedo não só fortalecem reputação, como atraem talentos que se importam com propósito.
Os incentivos à pesquisa, o apoio a startups, as linhas de crédito especiais e até os acordos internacionais de exportação mostram como o Estado continua sendo peça-chave para quem busca competir em escala global. A diferença está em como cada empresa lê e reage a esses sinais.
Em resumo, políticas públicas não são pano de fundo — são palco principal. Quem as enxerga como oportunidade ganha fôlego, inovação e mercado. Quem as trata como burocracia inevitável, corre o risco de se tornar irrelevante.
Riscos de Ignorar o Contexto Político
As empresas que ignoram a política pública estão, na prática, escolhendo correr riscos desnecessários. E não são riscos pequenos. A instabilidade financeira, por exemplo, não nasce do nada: é resultado direto de políticas fiscais e monetárias que mexem com juros, câmbio e inflação. Quem não acompanha essas mudanças fica sempre um passo atrás no planejamento e nos investimentos.
A mesma lógica vale para a conformidade regulatória. Não se trata apenas de “cumprir a lei”, mas de evitar multas, bloqueios e até a interrupção de operações inteiras. O preço da desatenção pode ser a própria sobrevivência do negócio.
Outro ponto frequentemente negligenciado é a perda de oportunidades. Programas de crédito subsidiado, incentivos fiscais ou linhas de apoio à inovação existem — mas só fazem diferença para quem está atento. O concorrente que aproveita primeiro sempre larga na frente.
E há ainda o fator reputação. Empresas que ignoram o contexto político arriscam sua imagem perante clientes, fornecedores, investidores e reguladores. Em um mercado cada vez mais guiado por confiança, isso pode significar a ruína de parcerias estratégicas.
Sem falar nos riscos legais. Uma mudança repentina em normas tributárias, trabalhistas ou ambientais pode gerar processos e custos inesperados que corroem caixa e minam previsibilidade.
O resultado dessa falta de atenção? Barreiras de entrada mais altas, perda de competitividade e incapacidade de expansão. Enquanto isso, aqueles que leem o cenário político com atenção conseguem acessar fundos, subvenções, benefícios fiscais e até novos mercados.
Ignorar a política pública, portanto, não é neutralidade. É abrir mão de vantagem competitiva e entregar espaço ao concorrente.
Política e Estratégia de Longo Prazo
Empresas maduras enxergam o ambiente político como parte do ecossistema estratégico. Incorporar o monitoramento de reformas, engajamento institucional, cenários prospectivos, adaptação cultural e gestão de riscos fortalece resiliência, inovação e competitividade.
Exemplo prático: se há sinais de avanço em políticas de economia verde, empresas podem antecipar processos sustentáveis, ganhando reputação e competitividade, mesmo com custos iniciais mais altos.
Exemplos setoriais:
Indústria: reoneração do ICMS sobre combustíveis em 2024 aumentou custos; logística repensada mitigou impactos.
Comércio: aumento de Cofins e contribuições exigiu ajustes em preços e mix de produtos.
Serviços: adequação à LGPD fortaleceu confiança de clientes e parceiros.
Agronegócio: políticas de exportação e sustentabilidade ampliaram competitividade global.
Conclusão
A política não é um cenário distante — é o pano de fundo que molda custos, regulamentações, reputação e estratégias das empresas. Ignorar essa relação equivale a navegar às cegas. Compreendê-la transforma a política em aliada, potencializando resiliência, competitividade e inovação.
Diante do contexto atual — com carga tributária recorde (32,32 % do PIB) e baixa competitividade —, a inteligência corporativa está em enxergar na política não apenas ameaças, mas também oportunidades estratégicas. Empresas que monitoram, antecipam e adaptam-se ativamente conquistam vantagem sustentável, independentemente do porte.
O GLOBO. Carga tributária chega a 32,3% do PIB, maior patamar em 15 anos. O Globo, 28 mar. 2025. Disponível em: https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2025/03/28/carga-tributaria-chega-a-323percent-do-pib-maior-patamar-em-15-anos.ghtml. Acesso em: 26 ago. 2025.
BRASIL. Ministério da Fazenda. Carga tributária bruta do governo geral atingiu 32,32% do PIB em 2024, mostra boletim do Tesouro. Gov.br, 28 mar. 2025. Disponível em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2025/marco/carga-tributaria-bruta-do-governo-geral-atingiu-32-32-do-pib-em-2024-mostra-boletim-do-tesouro. Acesso em: 28 ago. 2025.
REUTERS. Carga tributária bruta do governo geral atinge 32,32% do PIB, maior nível da série. UOL Economia, 28 mar. 2025. Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/reuters/2025/03/28/carga-tributaria-bruta-do-governo-geral-atinge-3232-do-pib-maior-nivel-da-serie.amp.htm. Acesso em: 28 ago. 2025.
O JORNAL EXTRA. Brasil gasta quase 9% do PIB com salários de servidores, segundo FMI. Extra, 2 jan. 2024. Disponível em: https://ojornalextra.com.br/noticias/brasil/2024/01/99901-brasil-gasta-quase-9-do-pib-com-salarios-de-servidores-segundo-fmi. Acesso em: 2 set. 2025.
FOLHA DE S. PAULO. Brasil fica em 46º lugar de ranking de competitividade com 66 países, diz novo índice. Folha de S.Paulo, 12 dez. 2024. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2024/12/brasil-fica-em-46o-lugar-de-ranking-de-competitividade-com-66-paises-diz-novo-indice.shtml. Acesso em: 3 set. 2025.
AGÊNCIA BRASIL. Prévia da carga tributária sobe para 32,32% do PIB em 2024. Agência Brasil, 28 mar. 2025. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2025-03/previa-da-carga-tributaria-sobe-para-3232-do-pib-em-2024. Acesso em: 5 set. 2025.
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SBT NEWS. Brasil fica em último no ranking de competitividade industrial, diz CNI. SBT News, 2025. Disponível em: https://sbtnews.sbt.com.br/noticia/economia/brasil-fica-em-ultimo-no-ranking-de-competitividade-industrial-diz-cni. Acesso em: 8 set. 2025.





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